Em 11 de setembro de 1973, o Chile viveu um dos episódios mais sombrios de sua história. O general Augusto Pinochet decidiu realizar um golpe de Estado com o exército contra o governo do socialista Salvador Allende, que, ao se ver encurralado pelas tropas, decidiu cometer suicídio naquele mesmo dia.
De acordo com a Comissão de Verdade e Reconciliação do Chile, o golpe civil-militar (parte do chamado Plano Condor de "descomunização" na América Latina) resultou na tortura de 28.459 pessoas. Outras 3.227 foram assassinadas ou desapareceram.
A ditadura, que mergulhou o país na repressão feroz e no neoliberalismo econômico, terminou em 1990.
A vitória de Salvador Allende não tinha precedentes em nível mundial, pois ele se tornou o primeiro político abertamente marxista a chegar ao poder por meios democráticos e eleições livres. Um fato que o tornou um ponto de referência para a esquerda global. Isso fez com que, em meio à Guerra Fria, ele fosse visto como uma ameaça pelos Estados Unidos e, especificamente, pelo governo do então presidente Richard Nixon.
Allende formou um governo progressista que priorizou o aumento do papel do Estado na economia e a melhoria dos direitos dos trabalhadores, tanto no campo quanto na cidade.
Mais do que um revolucionário, ele era um reformador que, no início, teve o apoio dos democratas-cristãos e da centro-direita, pois compartilhavam com ele a necessidade de mudança no Chile.
O apoio inicial dos democratas-cristãos e da centro-direita ao governo de Salvador Allende, contudo, foi diminuindo progressivamente entre a classe média alta à medida que a economia chilena piorava constantemente durante seus anos de governo.
Essa crise econômica tornou-se particularmente evidente a partir de 1972, quando a inflação alta e a escassez de determinados bens de consumo começaram a atingir os chilenos.
Essa situação foi causada por erros do governo, como a impressão excessiva de cédulas bancárias (que levou à superinflação), mas também teve a ver com decisões tomadas em Washington.
Henry Kissinger, Secretário de Estado dos EUA na época, reconheceu anos depois que era uma "prioridade" para os Estados Unidos que a economia chilena sofresse o maior número possível de problemas e que eles contribuíram para isso.
O objetivo dos EUA era deter a experiência cubana. Um exemplo como o de Salvador Allende poderia ser contraproducente para os interesses de Washington na América Latina, pois representava um caminho "mais gentil" para o socialismo democrático.
Os EUA tentaram a todo custo impedir a ascensão de líderes e movimentos progressistas na região por meio da promoção de ditaduras militares e estratégias geopolíticas como o Plano Condor.
O Chile é provavelmente o maior exemplo dessa aposta: desde o início do governo Allende, grupos de oposição de extrema direita foram financiados e um golpe militar foi incentivado.
Esses grupos de radicais desestabilizaram o governo com constantes ataques terroristas à infraestrutura e aumentaram a tensão social ao extremo. Era um tipo de conspiração que buscava favorecer uma mudança de governo pela força.
O momento decisivo ocorreu em 21 de agosto de 1973, quando o General Carlos Prats, que havia defendido o institucionalismo, foi forçado a renunciar sob pressão dos militares. Seu substituto como chefe do Estado-Maior seria o segundo em comando, um general com reputação de ser apolítico e com um histórico teoricamente limpo: Augusto Pinochet.
Diferentemente do que aconteceria mais tarde, ele era uma figura em quem Allende confiava porque parecia distante do clima de rebelião em alguns setores das forças armadas. Entretanto, quando chegou a hora, Pinochet se juntou à rebelião e a liderou.
Assim, em 11 de setembro de 1973, os militares assumiram posições em todo o país e controlaram eficientemente a mídia e cercaram o Palacio de la Moneda, o palácio presidencial onde Allende estava estacionado. O presidente tentou resistir no palácio com alguns de seus colegas e aproveitou o momento para transmitir seu último discurso na Radio Magallanes, que ainda não estava sob o controle de Pinochet. Essas foram palavras de despedida que entraram para a história.
Poucos minutos depois, tropas militares entraram no Palacio de la Moneda e, antes de ser preso, Salvador Allende decidiu se suicidar e atirou em si mesmo. No entanto, sua morte e o fim de seu governo não detiveram os militares, que continuaram a repressão nos dias seguintes, até assumirem o controle total do país e das forças do Estado.
As forças armadas chilenas proibiram todos os partidos políticos e começaram a prender qualquer pessoa suspeita de ser um militante de esquerda. Em Santiago, essas pessoas foram levadas para o Estádio Nacional, onde sofreram torturas constantes durante semanas e muitas delas foram mortas.
Esses dias de terror tiraram a vida de centenas de jovens, alguns deles referências culturais chilenas, como o cantor Víctor Jara, que morreu ferozmente torturado no emblemático Estádio Nacional, onde foi montado o maior campo de detenção clandestina do país.
Foi com base nessa tortura que o regime liderado por Pinochet conseguiu se estabelecer.
Essa ditadura sobreviveu por 17 anos graças a uma combinação de forte repressão contra dissidentes políticos e uma série de reformas estruturais neoliberais na esfera econômica.
A democracia só retornaria ao Chile em 1990, quando, em um resultado surpreendente, uma coalizão de oposição venceu um referendo sobre a continuidade de Pinochet e Patricio Aylwin se tornou presidente. Mas a sombra do ditador continuaria por décadas e persiste até hoje.
Pinochet nunca pôde ser julgado por seus crimes e, embora tenha sido perseguido pelo sistema judiciário graças a uma investigação do juiz espanhol Baltasar Garzón, nunca pôde ser levado à prisão.
A ditadura continua tendo um grande número de chilenos que a veneram e as reformas realizadas durante o regime ainda estão presentes no Chile, como o sistema de saúde neoliberal ou o sistema de pensões. Isso sem mencionar o fato de que, 33 anos após a chegada da democracia, a Constituição chilena ainda é a herdada do regime militar do ditador.
Pinochet recebeu asilo na Grã-Bretanha. A fortuna que sua família acumulou durante esses anos nunca foi totalmente revelada. Enquanto isso, o Chile ainda está tentando desvendar esse passado e se livrar da sombra de um ditador ainda onipresente.
Produção (Com base em agências AP- France25-BBC): Silvana Avellaneda
Tradução & Apresentação: Julieta Galván
Sonoplastia: Gloria Sarmiento
Produção Web: Julián Cortez- Pedro Aráoz